terça-feira, 29 de março de 2011

0018 - "Neurónios espelho" e as bases da cultura

Uma notável apresentação (apesar dos "rr" do inglês) sobre a importância das Ciências Cognitivas para o entendimento de uma "ontologia humana em rede" e de que a separação entre cultura e biologia, mente e corpo, é uma dicotomia datada.

VS Ramachandran

Segue-se o link para o texto do autor referido no vídeo:
Giacomo Rizzoliti, The Mirror-Neuron System

Assim como um outro artigo sobre o assunto:

(Informação enviada por António Castelo)

segunda-feira, 28 de março de 2011

0017 - Acesso ao passado ou o espelho do presente

Os problemas que têm marginalizado o interesse por estudos ontológicos em Pré-História, gerando cepticismo sobre a sua viabilidade, são vários, uns de natureza epistemológica, outros de natureza ela própria ontológica:

a)       Uma visão essencialista do homem, que impede de reconhecer o carácter histórico das concepções de se ser humano;
b)       A ideia de que o discurso científico é um conhecimento objectivo sobre o real e não uma relação com o real que produz uma representação sobre esse real, que não é com ele totalmente coincidente;
c)        A ideia de que pode existir uma Teoria Geral do Conhecimento e de um único método científico;
d)       A ideia, decorrente da anterior, que as Ciências Sociais só terão o estatuto de ciência se utilizarem o método das Ciências Exactas ou Naturais;
e)       A ideia de que a validação científica se restringe à validação por confirmação empírica;
f)         A ideia de que o presente não pode falar sobre o “sentido” no passado (sobretudo Pré-Histórico), devido aos problemas que a distância causa à hermenêutica;

entre muitos outros, mas para já, chegam estes.

Não me vou referir, naturalmente, de uma só vez a todos. Mas gostaria de começar pelo último, reproduzindo uma linhas que escrevi (texto global pode ser obtido aqui) em 2006.

“O desenvolvimento dos discursos da contingência tiveram como consequência, nas ciências da História, a instalação de um certo cepticismo relativamente às possibilidades de relação entre os discursos disciplinares e o passado que procurariam reflectir. Este crescente cepticismo desenvolveu uma percepção dos discursos da História ou da Arqueologia como presentistas, isto é, de que apenas reflectimos o presente quando falamos do passado. Esta inexorável prisão ao presente seria tanto mais constrangedora quanto mais nos afastamos no tempo do nosso objecto. Ao contrário da crença positivista, o distanciamento não é considerado como “objectivador”, mas como “subjectivador”. É hoje comum a argumentação de que a sociedade ocidental é a que revelará maiores dificuldades em falar das comunidades pré-históricas, porque será a que está mais distante em termos culturais globais destas sociedades que pretende estudar. Na concepção do mundo estamos condicionados pelos conceitos de que dispomos e pelas experiências que temos. Hoje vivemos num mundo racionalizado pelos crivos linguísticos da ciência moderna e experimentado, vivido e interpretado de formas que serão muito diferentes das desse passado longínquo. O nosso aparelho conceptual dota-nos de uma bagagem analítica que nos permitiu passar do passado enquanto mito a um passado racionalizado pela linguagem científica explicativa e compreensiva, ao mesmo tempo que contribuiu para nos afastar dos esquemas mentais que então operavam, tornando o processo de os entender bem mais complicado, mesmo quando mediado por contextos que concebemos como mais próximos desses passados. A própria ontologia seria diferente da nossa pois, como será argumentado no Capítulo 11, não existe uma essência humana a-histórica, pelo que ser humano há 5000 anos seria diferente de ser humano hoje. Como refere Hill (2000), a perspectivação de determinados aspectos da vivência humana como a-históricos gera um sentimento de familiaridade e de continuidade que dá origem a universalizações que estimulam a aposição ao passado de perspectivas presentes e de premissas de senso comum actual e permitem a construção daquilo a que chama um “passado familiar”. Assim, e como nos propõe o mesmo autor, a resposta à questão da viabilidade do “acesso” ao passado assenta na resposta a uma outra pergunta: conseguimos nós reconhecer um passado diferente? A resposta está, para o autor, na nossa capacidade de construir uma “Arqueologia Contrastante” que permita que, no diálogo que se estabelece entre presente e passado, este último também se possa exprimir.(...)

Poderá o passado ser actualmente pensado nos termos intelectuais do passado? Naturalmente que não. O alcance da minha cognição é o alcance dos meus conceitos. Pergunto então, como poderei aspirar a pensar o passado pré-histórico nos seus termos se nem sequer conheço as suas linguagens? Não se trata, pois, de aspirar, através de uma outra formulação retórica, à pretensão positivista de descentração presentista, nem à aspiração historicista de “entrar” na personagem histórica e reviver o passado tal qual ele aconteceu. Trata-se de assumir que os homens no passado terão sido diferentes em termos ontológicos e culturais (embora talvez não de forma tão radical como, por vezes, se parece conceber), que tiveram diferentes visões do mundo, diferentes relações com o espaço e com o tempo, que atribuíram diferentes sentidos às coisas e às suas próprias acções, mesmo que estas se pareçam formalmente com as nossas. Mas a questão mantêm-se: como entender essas diferenças? Como concretizar essa Arqueologia Contrastante? (...)

De facto, é evidente que qualquer trabalho arqueológico é um acto contemporâneo de leitura, que um contexto arqueológico é uma “realidade” presente, lida hoje, por alguém que não pode fugir às condicionantes do seu tempo. Não menos verdade será que os passados, sobretudo os mais distantes, terão sido substancialmente diferentes do(s) nosso(s) presente(s). Mas aquilo com que nós, arqueólogos, nos relacionamos no presente é algo que nos chega das profundidades do tempo e que, por mais transformações tafonómicas ou outras que tenha sofrido, mantém níveis de relação com o passado em que teve origem. O sítio está num determinado lugar e não noutro; existem determinadas cerâmicas e não outras; documentam-se umas tecnologias, outras não; as arquitecturas assumem determinadas características e não outras e os espaços organizam-se de certas formas entre outras possíveis, etc. Tudo isto, embora faça parte de leituras realizadas no presente, se vincula ao passado, às opções então tomadas, às vivências então existentes. Essa vinculação permite que se estabeleça a relação e viabiliza a Arqueologia como disciplina. Se todos os discursos sobre o passado são feitos a partir de um dado presente, se lhe são implacavelmente relativos, é bom ter consciência que revelam um esforço de relação entre subjectividades presentes e subjectividades passadas, as quais estão incutidas, de forma mais ou menos codificada, nas materialidades (no seu sentido lato) que nos chegam e, de certa forma e até certo ponto, na nossa própria existência, já que é do “nosso” passado que estamos a falar.
Assumir a relação, a inter-subjectividade, significa aceitar as diferentes contextualidades e alargar o nosso pensamento a alternativas plausíveis, que nem sempre são passíveis de ser demonstradas empiricamente, mas que possibilitam que, face ao nosso quadro formatador, se caminhe no sentido de uma relação em que “the difference of the past reveal itself as itself” (Thomas, 2004: 238). Note-se a subtileza da expressão de Thomas: não é deixar o passado revelar-se, mas sim a diferença do passado.”

António Carlos Valera

sexta-feira, 18 de março de 2011

0016 - Arqueologia e Ciências Cognitivas

As problemáticas das ciências cognitivas aplicadas à História e Arqueologia vêm-me interessando cada vez mais, nomeadamente para a abordagem dos processos de neolitização e da emergência das tradicionalmente designadas “sociedades complexas”. Existirá uma estrutura básica de funcionamento da mente humana ou poderemos traçar-lhe percursos históricos? Poderemos relacionar formas e dinâmicas de organização no espaço e no tempo, formas de vida, visões do mundo, com transformações da mente? Estas problemáticas têm sido tratadas pela Arqueologia essencialmente no âmbito dos estudos relacionados com os trajectos da hominização até ao Homem moderno, mas têm sido menos consideradas na Pré-História Recente.

Ora um dos aspectos mais interessantes em tratar estas questões em sociedades constituídas por homens anatomicamente modernos é que permite realçar o facto de que a transformação das estruturas mentais ultrapassa a questão da evolução física, sublinhando o papel da cultura na estruturação e reestruturação das formas de pensamento. Como sustenta Merlin Donald, “a cultura pode, literalmente, reconfigurar os padrões de uso do cérebro”. Ou, por outras palavras, que implicações têm a emergência da agricultura e a domesticação, por exemplo, nos modos (versões para utilizar a terminologia de L. Strauss) de funcionamento da mente e nas formas como o Homem racionaliza o mundo? Ou, ao contrário, que implicações têm para aa dinâmica da neolitização alterações cognitivas que se processam durante o Paleolítico Superior?

A relação com as problemáticas das ciências cognitivas e com os desenvolvimentos que se vão realizando noutras áreas que se dedicam ao estudo da mente humana, sejam elas de pendor mais científico ou filosófico, são uma área a que a Arqueologia portuguesa (sobretudo a que se dedica à Pré-História) também se deveria abrir.

Neste contexto de percepção da historicidade do funcionamento das estruturas cognitivas, tanto na sua dimensão individual como colectiva, uma abordagem que utilize as potencialidades da analogia entre o estudo do desenvolvimento das estruturas operativas dos processos cognitivos no indivíduo actual e os de diferentes contextos históricos, poderá ajudar-nos a dar conta de distintas formas de pensar e de construir identidades e, desta forma, criar possibilidades a uma arqueologia contrastante dos processos de identificação, viabilizando discursos não essencialistas sobre as identidades do passado.

“(...) se adoptadas as devidas precauções, é possível comparar as formas de pensar de contextos remotos com os tipos de processos de pensamento exibidos e os tipos de medições utilizadas nos contextos da tradicional escolaridade ocidental”
(Gardner, 2002: 347)

Referências:
Donald, Merlin, (1999), Origens do Pensamento Moderno, Lisboa, Fundação Calouste GulbenKian
Gardner, Howard (2002), A nova ciência da mente. Uma história da revolução cognitiva,Lisboa, Relógio D'Água.

António Carlos Valera

quarta-feira, 16 de março de 2011

0015 - Ideias como objectos ... II

A propósito da “objectivação” de uma “ideia” …

… os estudos de talhe experimental têm demonstrado a existência de uma “ideia” prévia à produção do objecto de pedra lascada. Não será esta “ideia” prévia que está na origem da repetição dos gestos na produção desse “objecto”? Aquilo que os pré-historiadores chamam tecnologia?

Ver aqui exemplo da técnica Levallois

Cláudia Costa

sexta-feira, 11 de março de 2011

0014 - Ideias como objectos...

... ou a "objectificação" de uma ideia. Ver aqui: http://www.youtube.com/watch?v=0uofpcqw81o

De facto, um certo materialismo "primitivo (?)" induz-nos a pensar que uma ideia deriva de uma materialidade (independentemente da discução em torno da fisicalidade dos nossos processo cognitivos, entenda-se). Em Arqueolgia, é frequente encontrar-se a tese de que o objecto precede a ideia, ou por outra palavras, que o símbolo é precedido pelo simbolizado. A constante percepção de há algo primeiro e que depois é simbolizado, representado simbolicamente. Há uma prática essencialmente material e, depois, a sua representação ideológica. Há estrutura e superestrutura, e, apesar de todos os malabarismos da segunda, a primeira é a grande condicionante (para alguns ainda determinante).

Ora eu diria que em muitas situações ocorre o inverso. O objecto é o símbolo de uma ideia. O objecto é a reperesentação material de algo que foi primeiro idealizado, que existiu primeiro como abstracção e só depois se produziu a "representação" material dessa ideia.

Na realidade, parece ser isso que permanentemente ocorre quando produzimos algo: primeiro idealizamos a situação, o objecto, a estrutura; depois produzimos a sua representação material. Esta, como representação que é, nunca se ajusta na perfeição ao idealizado. Da mesma forma que, no processo contrário, uma representação ideográfica nunca se ajusta na perfeição ao objecto assim representado.

Resulta a ideologia de uma materialidade da vida ou é a materialidade da vida o resultado de uma ideologia?

Nesta mecanicista procura de um princípio determinante, nesta verdadeira metáfora do ovo e da galinha, será mesmo possível separar a ideia do objecto e discernir que uma das partes emerge primeiro em total independência das "propriedades" da outra? Poderei eu pensar um objecto fora das minhas relações prévias com o mundo material? Poderei eu representar mentalmente um objecto, fora do contexto mental da minha atribuição de sentidos ou das minhas escalas de grandeza?

Ideias como objectos ou objectos como ideias? Não serão duas faces de uma mesma moeda?
E, no entanto, a Arqueologia continua a tratar ideias como ideias e objectos como objectos. Materialismo e idealismo continuam nas suas tradicionais desavenças e o corpo continua a não se entender com a alma.

E, como dizia A. Jacqués, esta maneira de nos dividirmos em dois é extraordinariamente desgradável.

António Carlos Valera

quarta-feira, 9 de março de 2011

0013 - Patas de animais em contexto funerário


Deposição de pata de suídeo sob corpo humano na Fossa 11 do Sector I dos Perdigões (Reguengos de Monsaraz)

O problema da segmentação dos corpos coloca-se também relativamente aos animais. À medida que vão aumentando as intervenções em contextos funerários bem preservados (que ocorrem sobretudo em estruturas negativas, tipo fossa ou hipogeu, já que os monumentos megalíticos tendem a apresentar-se em situações de maior revolvimento e degradação) aumenta também o número de evidências de deposições de partes de animais, tradicionalmente entendidas como simples deposições votivas de alimentos. Todavia, a recorrência de determinadas partes do corpo, como uma simples pata, e a ausência sistemática de outras pode sugerir-nos que existe um sentido acrescido, relacionado com o estatuto dessas partes do corpo (tipo “pata de coelho dá sorte” ou outro qualquer).

Nos contextos da Pré-História Recente que têm sido intervencionados nos últimos anos no Sul de Portugal, esta prática do ritual funerário tem sido registada desde o final do Neolítico até à Idade do Bronze, sendo vários os tipos de animais representados: porco, cão, bovídeo, ovicaprinos. Mas faltam-nos ainda um número mais significativo de contextos, bem intervencionados e questionados, para que padrões de comportamento possam começar a emergir. Para já, fica a chamada de atenção para a necessidade de publicar estas particularidades sempre que ocorram, não as deixando “na gaveta”, como algo de pouco relevante para a compreensão do Homem e das suas cosmologias (e sempre à espera de grandes monografias finais, que raramente se escrevem).

(Ver também aqui)

António Carlos Valera

terça-feira, 8 de março de 2011

0012 - Ser membro.

A adesão ao projecto CEOPH está a ser interessante. Mas ambicionamos mais.
A vida e utilidade deste tipo de iniciativas dependem do voluntarismo dos membros e do interesse e qualidade das suas intervenções. Estas últimas valorizações devem ser entendidas como responsabilização e estímulo, mas não como factor inibidor. Um dos objectivos desta iniciativa é fazer crescer intelectualmente, em conjunto, mais velhos e mais novos, mais e menos experientes, em diálogo e sem preocupação de consensos.

Toda a plataforma é, neste momento, administrada por um grupo dinamizador e disponibiliza aos membros as seguintes iniciativas, para além da normal participação nos comentários do blog:

a) Mandar posts para publicação que suscitem debates sobre as problemáticas em questão ou forneçam informações úteis: reuniões científicas, palestras, bibliografia, etc. ou colocar questões e problemas que estejam a trabalhar no âmbito das suas actividades académicas ou profissionais, passíveis de suscitarem debate e esclarecimentos.
b) Propor iniciativas, tanto para o espaço do blog, como de outro género (a título de exemplo: saídas de campo para debates in locco sobre temáticas deste projecto e às quais membros possam aderir);
c) Colocar ligações para textos da autoria dos membros disponíveis na net (descarregamento gratuito), até 5 referências por membro (renováveis);
d) Integrar a lista de membros, com contactos e filiação institucional disponíveis.

Fundamental será ser activo e criativo. De certo, seremos capazes de nos ir inspirando uns aos outros e multiplicando o interesse com que, desde já, a iniciativa parece ter sido acolhida.

segunda-feira, 7 de março de 2011

0011 - What is an idol?

Os “ídolos” e antropomorfos encontrados em contextos arqueológicos da Pré-História recente sempre exerceram um fascínio sobre quem os encontra. Ter na mão um cilindro de calcário decorado ou não, uma placa de xisto com olhos raiados ou uma pequena estatueta de pessoa ou animal parece aproximar-nos, mais do que qualquer outro objecto pré-histórico, das pessoas que os criaram.
Porque será isto assim? O que distingue, de facto, estes elementos de todos os outros? Porque é que entram logo na categoria de “objectos de excepção” nas colecções arqueológicas? Porque são belos e relativamente raros. Porque reportam para um mundo mágico e simbólico. Porque são ídolos. Porque sim. E assim permanecemos, nesta retórica essencialista, como lhe chamou Douglass Bailey.

A investigação pré-histórica na Península Ibérica pouco ou nada se tem dedicado ao tema das produções simbólicas, à excepção da publicação de notícias de novos achados. Há algumas excepções. Vítor Hurtado analisa, num artigo de 2008, as variações estilísticas  de certos grupos de ídolos (placas de xisto, ídolos oculados e antropomorfos) e coloca a hipótese de estas poderem reflectir as diferentes estruturas sócio-identitárias e territoriais das populações  que ocuparam o Sul da Península Ibérica no IV e III milénio AC.  Katina Lillios e Vítor Gonçalves desenvolveram projectos de investigação sobre ídolos-placa. Numa publicação de 2002, Katina Lillios avança com a hipótese das placas de xisto, elementos que apenas surgem em contextos funerários, cumprirem uma função heráldica em que as bandas decoradas veiculariam informação sobre a linhagem dos indivíduo comunicando, assim, ideias de pertença a um determinado grupo social.

O tema pode ser aprofundado. O Complexo Arqueológico dos Perdigões forneceu, até ao momento, uma colecção interessante deste tipo de artefactos. Entre ausências e presenças, o conjunto artefactual terá que ser cuidadosamente analisado. Pensá-los à luz de conceitos ontológicos pode ajudar-nos a responder a algumas questões centrais e críticas para o seu entendimento.

-  O que torna um objecto um ídolo? A função? O contexto em que foram encontrados? As suas características intrínsecas? O seu contexto de utilização? A matéria-prima?
- O que representam? E são o que representam? Que significado e consequências cognitivas tem a representação para as populações que os criaram e manusearam?
- Que nos dizem estes elementos sobre a visão do mundo das populações neolíticas/calcolíticas? E sobre a sua visão do Ser?

Esta nossa abordagem só agora começou. Integrar esta discussão neste grupo, aberto e transdisciplinar pode produzir um debate interessante e dar-nos as ferramentas para alargar o questionário relativo à ideia de ídolo na pré-história.

Referências bibliográficas:
Bailey, D.W., 2005:”Prehistoric Figurines. Representation and Corporeality in the Neolithic”. Routledge Books.
Hurtado, V.  “Ídolos, estilos y territorios de los primeros campesinos en el sur peninsular”, “Ojos que nunca se cierran. Ídolos en las primeras sociedades campesinas”, Museo Arqueológico Nacional, 2009
 Lillios, K. 2002: “ Some new views of the engraved slate plaques of southwest Iberia”. Revista Portuguesa de Arqueologia 5 (2): 135-151

Lucy Evangelista

domingo, 6 de março de 2011

0010 - A contribuição da Psicologia Evolutiva

Psicologia Evolutiva – é um ramo da Biologia que estuda o comportamento animal sob uma perspectiva biológica de Adaptação e Selecção Natural. É uma disciplina que nasce no seguimento da “Sociobiology” e da “Behavioural Ecology”.

Tem como objecto de estudo os comportamentos e predisposições naturais que são universais e transversais ao Homem.

Artigos seminais para o surgimento da disciplina foram, entre outros, o de Robert Trivers (1971), “The Evolution of Reciprocal Altruism”; o de Robin Dunbar (1992) “Neocortex size as a constraint on group size in primates”; e o de John Maynard Smith (1982) “Evolution and theory of games”.

cinco palavras de ordem que, a meu ver e para , se adequam para orientar a contribuição que a Psicologia Evolutiva tem para trazer a um debate desta natureza. Essas são: Socialidade; Antropomorfização; Cultura; Arbitrariedade; Grupo.

Estudos da área da Neurociência Cognitiva Social trazem à luz evidência da antropomorfização inconsciente com que os primatas interpretam o mundo e os agentes/objectos que os rodeiam. Evidências na interacção social e na elaboração de processos neuronais decisivos de linguagem e acção apontam no sentido de antropomorfização constante. Esta antropomorfização resultará da utilização de uma aparelhagem cognitiva social extremamente desenvolvida, que estará na origem da maior parte da diferenciação cognitiva dos humanos para os outros primatas mais próximos.

A separação emocional do observador/objecto e a consequente degradação da consideração animista resultarão de um estabelecimento arbitrário e cultural do espírito científico que é hoje completamente absorvido pela cultura a uma escala global, com especial ênfase no Ocidente. sem os códigos “bio-lógicos” naturais de uma linguagem interpretativa o Homem deixa de “sentir/experienciar” e passa a racionalizar e a contabilizar em exclusivo. A discussão de David Abraam “O Alfabeto e o Animismo” (Abraam, 2007) trata este tema.

Uma ferramenta de organização importante do Homem e de outros primatas na catalogação e compreensão do Mundo em que se movem é a formação de grupos. A dicotomização imediata dos fenómenos naturais é uma predisposição imediata e universal, e muitas vezes traduz-se no estabelecimento de “in-group” e de “out-group. Nãorazão nenhuma, antes pelo contrário, para crer que o estabelecimento de um “in-group” é específico, ou seja, que incorpora somente animais de uma mesma espécie. E há certamente motivos para investigar a ocorrência generalizada de formação de grupos multi-específicos, principalmente numa atmosfera de inter-especificidade rica como o são as comunidades Homo. É de esperar que a inclusão de animais não-humanos (e.g. animais domésticos) em grupos por parte de agentes humanos tenha interferências fortes no estabelecimento de relações sociais (não utilitárias) com esses mesmos animais.

A contribuição da Psicologia Evolutiva para este debate é trazer uma linha de diálogo entre nós e as comunidades pré-históricas no sentido de compreender as limitações interpretativas/sensoriais, tal como as predisposições cognitivas que são comuns a todos os Humanos.

António Castelo

sexta-feira, 4 de março de 2011

quinta-feira, 3 de março de 2011

0008 - Por uma Arqueologia da fragmentação

A fragmentação é uma estratégia social ao serviço da comunicação e da gestão de relações. No caso concreto dos objectos, esta questão leva-nos a questionar o conceito de “unidade” ou, se quiserem, de “todo”. Se aceitarmos que o sentido faz parte da constituição do objecto social (a Arqueologia trabalha com objectos sociais e não simplesmente com objectos físicos), situações aparentemente paradoxais podem ocorrer:

a)     Uma metade pode, pelo significado que assume, ser de facto o todo (a unidade). É esse, por exemplo,  o princípio da hóstia, que, fragmentada, não deixa de representar o corpo de Cristo. Trata-se do processo psicológico de “participação” em que as essências do todo estão presentes na parte, pelo que a parte representa (ou é) o todo.
b)    Por outro lado, uma unidade (um todo) pode representar (ser) apenas uma parte. É o caso das alianças, que uma é apenas parte e o todo são as duas. A unidade é, aqui, apenas metade.

Ou seja, a ontologia dos objectos é algo que temos que ter em consideração quando estudamos artefactos e contextos pré-históricos. A fragmentação pode ser intencional e traduzir sentidos. É importante despistar a interferência da tafonomia, mas, como dizia há dias, só vemos o que estamos preparados para ver: porque será que ocorrem tantas metades de objectos em contextos Pré-Históricos bem preservados? Porquê precisamente metades? Ou segmentos de corpos (humanos ou de animais)?

E, no entanto, dividir e distribuir, como forma de ligar e, paradoxalmente, unir , é algo que mantemos como estratégia nos complexos sistemas das nossas relações sociais. A partilha une, e nisto a fragmentação joga um papel central. A fragmentação do objecto, do corpo, da comunidade. São níveis de uma prática que me parece central para o entendimento das comunidades pré-históricas.

Em português:
VALERA, António Carlos (2010), "Marfim no recinto calcolítico dos Perdigões (1): "Lúnukas, fragmentação e ontologia dos artefactos", Apontamentos de Arqueologia e Património, 5, Lisboa, NIA-ERA Arqueologia, p. 31-42. (link disponível na pagina de Publicações de Membros)

Em inglês:
CHAPMAN, J. (2000), Fragmentation in Archaeology: people, places and broken objects in the Prehistory of South-Eastern Europe, London, Routledge.
CHAPMAN, J. e GAYDARSKA, G. (2007), Parts and wholes: fragmentation in prehistoric context, Oxbow Books.

António Carlos Valera

0007 - Meeting Stars and Stones

Voyages in Archaeoastronomy and Cultural Astronomy - A meeting of different worlds
September 19 - 23, 2011, Évora (Portugal)

An International Conference on Archaeoastronomy and Ethnoastronomyhttp://www.ciuhct.com/seac2011
Under the Patronage of the http://www.archeoastronomy.org

Since Prehistory that the sky was always been integrated as part of the cosmovision of human societies. The sky played a fundamental role not only in the space orientation, in the time organization, in the ritual practices or in the celestial divination but also as an element of power.

Migrations and voyages are intrinsic to the humankind, they opened the routes for cultural diffusion and trade, but also for power dominance. Following their routes is also to follow their cultural diversity and how they met or clashed. The sky and astronomical phenomena provided the tools for time reckoning, calendar organization and celestial navigation that supported those voyages. Astronomy gives us today the capacity to reproduce the sky, opening a window through which we can glimpse how those societies perceived, integrated and manipulated the sky into their world views and their myths, and, ultimately, into their society organization.
A voyage is always a meeting of different worlds and a process to accept diversity. We wish that this Conference will be also a meeting of different worlds in the invited lectures, in the public lectures, in the LOC/SOC and in the audience.

The main conference topics are:
• Techniques of celestial navigation and orientation of the past. Astronomical navigation and nautical instruments in XIV, XV and XVI centuries.
• Expressions of astronomical knowledge in architecture and monuments, rock art, archaeology and landscape. People migration, a meeting between different cultures
• History of astronomy. A meeting between different conceptions
• Astronomy and the Jesuits. A meeting between different worlds
• Astronomy in antiquity. A meeting between different knowledges
• Ethno-astronomy, Cultural Astronomy and myths, voyages in space and in time through different cultures.
• To where is Archaeoastronomy voyaging? A round table about Archaeoastronomy, Cultural Astronomy and Education

Call for papers is officially opened!
For further informations please check our home page at: http://www.ciuhct.com/seac2011


(Informação enviada por Fábio Silva)

quarta-feira, 2 de março de 2011

0006 - Placing Animals in the Neolithic Social Zooarchaeology of Prehistoric Farming Communities




This book presents a new perspective on the social milieu of the Early and Middle Neolithic in Central Europe as viewed through relations between humans and animals, food acquisition and consumption, as well as refuse disposal practices.

Based on animal bone assemblages from a wide range of sites from a period of over 2,000 years originating in both the North European Plain lowlands and the loess uplands, the evidence explored in the book represents the Linear Band Pottery Culture (LBK), the Lengyel Culture, and the Funnel Beaker Culture (TRB) allowing us to follow the dynamic development of early farmers from their emergence in the area north of the Carpathians up to their consolidation and stabilization in this new territory.
This title is sponsored by Institute of Archaeology, University College London.
"… the book is about ‘interpretive social zooarchaeology’, focusing on Central European early farming (Neolithic) communities. Marciniak adopts a taphonomic approach, as do a growing number of zooarchaeologists today, and looks at the ‘horizontal distribution of faunal remains’ — the latter being something which is undertaken less often than it is when considering other archaeological material such as stone tools. As such it is not a new approach, but it is a new attempt to combine approaches which are frequently considered separately…there is one thing which cannot be denied: it amply illustrates the complexity of the faunal record — a complexity which is often overlooked when dealing with the post- Pleistocene record. It shows that social as well as economic reconstruction may be possible, that faunal data can record something more than the environment and what was eaten. "
- Katie Boyle, Environmental Archaeology

"[This is] a bold and refreshing attempt by Arkadiusz Marciniak to re-energize and broaden studies of animals in the early and middle Neolithic of central Europe. I see much still to do as we try to come to grips with all aspects of keeping, managing, eating and thinking animals in the early to middle Neolithic, but this book is a significant contribution to that process. "
- Alasdair Whittle, Cardiff School of History and Archaeology
Fonte

Cláudia Costa

0005 - Links para textos online

No menu do blog, foi criada uma nova página destinada à colocação de ligações a textos disponíveis gratuitamente online, da autoria de membros do CEOPH, e que versam sobre temáticas que se enquadram nos objectivos do grupo.
Cada membro poderá enviar até um máximo de cinco referências que considere mais adequadas para divulgação e debate neste espaço, acompanhadas dos respectivos links e três palavras chave. Estas referências poderão ser substituídas por outras, sempre que cada membro desejar renovar as suas contribuições.

terça-feira, 1 de março de 2011

0004 - O contributo da Zooarqueologia

A Zooarqueologia é entendida como a disciplina que estuda dos restos de animais provenientes dos sítios arqueológicos numa perspectiva antropológica sendo o seu principal objectivo a compreensão do comportamento humano na sua relação com o meio ambiente envolvente, distinguindo-se da Arqueozoologia que se debruça sobre a perspectiva biológica da evolução das espécies animais sob influência do comportamento humano.
Surge na primeira metade do século XX, mas é na década de 60, com a implantação da designada Nova Arqueologia, que se afirma, nomeadamente com o desenvolvimento de uma metodologia própria, assumindo inclusivamente uma enorme importância como estudo actualístico. Com o desenvolvimento das correntes pós-processualistas assume um novo objectivo: a compreensão da dimensão social e cultural da relação do Homem com o outro animal.
Beneficia largamente da introdução do conceito de contexto na Arqueologia, primeiro com o desenvolvimento da Middle Range Theory por Lewis Binford e Michael Schiffer e mais tarde com a designada Arqueologia Contextual de Ian Hodder que eleva o conceito ao “contexto de uso” através da aplicação da hermenêutica.
Na actualidade, no espaço europeu, o desenvolvimento de estudos arqueofaunísticos de contextos históricos, permitiu a criação de interfaces entre os estudos das faunas e outras áreas do saber, como a História, a Etnografia e a Antropologia que rapidamente tiveram eco na produção científica sobre épocas pré-históricas. Assiste-se, assim, a um abandono progressivo da perspectiva estritamente economicista e funcionalista na interpretação das associações faunísticas para se começarem a abrir novos caminhos na interpretação dos restos faunísticos em que os restos são entendidos como reflexo de organizações politicas, sistemas de crenças, estatuto social e construção de identidades.
A introdução da Zooarqueologia na plataforma de interdisciplinaridade que pretende ser o CEOPH tem todo o sentido e surge como consequência desta evolução epistemológica, principalmente no que diz respeito à questão da relação Homem/Animal. Esta participação tem um objectivo muito claro, a promoção do debate sobre a interpretação das associações faunísticas em contextos arqueológicos à luz da contextualização de novas linhas de investigação que poderão estender-se da Antropologia à Psicologia Social ou Arqueologia Cognitiva.

Cláudia Costa